JESSÉ SOUZA

Sobre piscinas, igarapés e água em um cenário que passa ignorado a cada ano

Em vários municípios do Estado, moradores precisam acumular água em baldes na maior parte do dia (Foto: Divulgação)

Dentro de todo esse cenário visto durante os períodos de estiagem, em que falta água potável na rede de distribuição mantida pela Companhia de Água e Esgoto de Roraima (Caer) nos municípios do interior, quase sempre nunca se fala a respeito desse assunto com a seriedade que merece, uma vez que toda a atenção fica concentrada nos incêndios florestais e queimadas descontroladas.

Mas o fato é que, desde o grande incêndio de 1997/1998, descobriu-se que o sistema de distribuição de água no Estado é precário, onde até hoje falta água nos municípios em boa parte do ano, cujo problema se amplia nos tempos de forte estiagem, como está ocorrendo agora, neste verão. Para citar um município onde a seca mais vem castigando, o Amajari, falta água rotineiramente a qualquer época do ano. E isso se repete em outros municípios.

Aliás, nem precisa de forte estiagem. A própria Capital sofre com a falta de água constantemente. Há meses em que de 10 a 20 bairros têm o fornecimento de água suspenso por causa de problemas na frágil rede de distribuição. Se não chover em breve, em Boa Vista, o Rio Branco deverá secar ainda mais, o que pode comprometer o abastecimento. Tal problema histórico já deveria ter sido resolvido há tempos, pois água é (ou deveria ser) uma prioridade absoluta.

Se na Capital é recorrente, em determinadas localidades do interior de Roraima (senão em todas) é um problema quase que diário, em que a população que não tem caixa d’água precisa se virar com baldes, camburões e outros recipientes se não quiserem passar pelo transtorno maior de não poderem sequer ter água para fazer a refeição do dia.

Responsável também pelo esgoto sanitário no Estado, a Caer não consegue resolver outra questão histórica, que é o lançamento de esgoto no leito dos igarapés urbanos que deságuam no Rio Branco, que é o nosso principal manancial de água potável, o qual já é agredido pela ação do garimpo ilegal em terras indígenas.

Esta semana, leitores denunciaram o lançamento de dejetos no Igarapé Caxangá, no Centro, que deságua no Rio Branco exatamente no Mirante do Parque Rio Branco, e no Igarapé Grande, no bairro São Bento, o qual também lança suas águas poluídas no principal rio do Estado. Essa cena ocorre em outros igarapés em áreas nobres, como o Mirandinha, no bairro Caçari, que deságua também no Rio Braco, abaixo do sistema de captação de  água da Caer que abastece a Capital.

Nem precisa de um perito para identificar o lançamento de esgoto sem tratamento nos igarapés que cortam a cidade, assim como no Igarapé Caranã, pois a fedentina é sentida por quem passa nas avenidas onde estão esses mananciais. Nesses igarapés, peixes e outros animais que dependem da água e para se alimentar aparecem mortos ao longo do trajeto de seu leito. Fora a ligação de esgoto clandestino nas residências, problema nunca fiscalizado.

A falta de água, o esgoto lançado nos igarapés e outros problemas que afetam a população diretamente, a exemplo das recorrentes denúncias de preços abusivos cobrados na conta de água do consumidor, mostram que algo precisa ser feito. Como não se trata de problemas novos, significa que os órgãos fiscalizadores nunca levaram tais questões a sério, mesmo sendo problemas graves, que dizem respeito ao abastecimento de água para a população e danos irreparáveis ao meio ambiente.

O assunto nem alarma mais as autoridades e instituições, pois os moradores abastados nem notam quando falta água, pois eles têm seus reservatórios particulares, e também não estão nem aí para igarapés e rios poluídos, pois as piscinas em seus quintais costumam ser seu mundo desconectado da realidade ambiental e ecológica vivida pela população.

*Colunista

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