JESSÉ SOUZA

São várias as camadas que partem de um crime que está sendo desvendado

Regularização fundiária é uma das grandes questões que precisam de uma rápida solução no Estado de Roraima

Os passos que seguem para o desfecho do assassinato do casal de agricultores no Cantá, no dia 23 de abril, trazem várias camadas que precisam ser analisadas dentro de um grande contexto no que se tornou o Estado de Roraima.  O principal deles é que havia uma clara ação que mostrava certeza de impunidade pelo status dos principais envolvidos.

Os envolvidos só não contavam que, atualmente, com os modernos aparelhos celulares, existem recursos para gravar e filmar quaisquer ações que podem servir como prova. E foi exatamente um áudio gravado por uma das vítimas da execução sumária que possibilitou os investigadores a puxarem o fio da meada.  

A Polícia Civil já confirmou que o covarde crime contou com o envolvimento do empresário Caio de Medeiros Porto e do capitão da Polícia Militar Helton John da Silva de Souza, este último exonerado da função de chefe de segurança da Casa Civil – ou seja, um militar que trabalhava no centro do poder local e que certamente apostava em sua influência.

As autoridades se apressaram em investigar não apenas porque é interesse dos políticos que esse odioso crime, motivado por disputa fundiária, caia exatamente no colo dos responsáveis, sem que haja possibilidade de respingar sobre a questão fundiária do Estado, a respeito da qual pipocam denúncias de irregularidades supostamente praticadas por gente importante.

Outro fato foi a comoção da opinião pública que lançava olhares atravessados para cima da Polícia Militar, uma vez que outro PM estava sendo apontado como principal suspeito pela morte brutal de uma adolescente de 17 anos em Rorainópolis. E isso em sequência das investigações de um grupo de PMs suspeitos de integrarem milícia que matava simulando enfrentamento policial.

E outro fato não menos preocupante: houve manifestações nas redes sociais de pessoas que insinuavam ter ligações com o mundo do crime ameaçando que, caso a polícia e a Justiça não se pronunciassem, eles estariam decididos a fazer justiça com as próprias mãos, que é uma situação grave e que deveria igualmente ser investigada diante do quadro de criminalidade que se abate sobre o Estado.

Além de tudo isso, é necessário que se abra a “caixa-preta” da questão fundiária no Estado, pois não se tratam apenas de recorrentes denúncias já de conhecimento da opinião pública. O próprio áudio dos envolvidos no crime do casal no Cantá há uma fala afirmando categoricamente da existência de um esquema fraudulento dentro do órgão fundiário estadual.

É muito improvável que a Assembleia Legislativa de Roraima crie uma CPI da regularização fundiária, uma vez que há pelo menos um emblemático caso em que invasores de uma propriedade em Bonfim estejam agindo sob a garantia e o apoio exatamente de políticos com mandato. Inclusive existem provas contundentes com ocorrência policial e processo na Justiça.

Existem outras camadas que precisariam ser explicitadas, uma vez que há outros assassinatos sob suspeita de terem motivação por questão fundiária. No entanto, somente a morte do casal, no Cantá, é suficiente para que a sociedade cobre que as autoridades não apenas desvendem completamente o crime e façam justiça, mas que, também, seja passado a limpo o Estado por completo.

Então, é agora que deveriam aparecer essas pessoas de bem que tanto se falam na política. Onde elas estarão?

*Colunista

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