JESSÉ SOUZA

Rumorosos casos envolvendo policiais e o preocupante silêncio das autoridades

Nos últimos anos, Polícia Militar de Roraima teve que lidar com denúncias envolvendo membros da corporação (Foto: Divulgação)

No dia 20 de agosto de 2023, em uma entrevista concedida pelo delegado Marcos Lázaro à Rádio Folha 100.3, ele abordou sobre a delicada situação da Segurança Pública, inclusive falou da realidade da Polícia Civil de Roraima. Ele alertou para o surgimento de milícias com recrutamento de policiais da ativa ou aposentados para atuarem na defesa de interesses escusos, especialmente o garimpo ilegal e o tráfico de drogas. O fato inclusive foi tema do artigo “O alerta que faltava e a grave situação da geografia do crime nos dias atuais”, publicado dois dias depois.

Embora tenham sido declarações bombásticas, não houve repercussão o fato de um delegado da Polícia Civil fazer graves declarações. Sequer o tema indignou algum parlamentar na Assembleia Legislativa ou mesmo na bancada federal, em Brasília. Calados todos ficaram e calados todos seguem até aqui. No entanto, esta Coluna há tempos vem chamando a atenção para a nova geografia do crime em Roraima, cujo ápice da questão foi tratado no artigo “A realidade da Segurança Pública está aí e o relógio já está com o tempo estourado”, publicado em 12.09.2022.

O texto tratou de cenário da insegurança, abordando o caso de policiais militares que, em uma ação suspeitíssima, tentaram resgatar uma aeronave que dava apoio ao garimpo ilegal, em que um PM morreu e dois saíram ilesos. À época, o dono do avião gravou um áudio, compartilhado em grupos de aplicativos de mensagens, afirmando que contratara PMs para fazer segurança privada. Em seguida, o presidente da Associação Unificada de Praças de Roraima (Auprarr), em  entrevista à Rádio Folha, tratou o fato como normalíssimo,  ou seja, um amigo de farda que foi fazer um “serviço extra para recuperar uma aeronave que não havia sido paga”.

Estava tudo bem desenhado antes mesmo do que aquele delegado alertou em sua entrevista. O garimpo ilegal, o tráfico de drogas, o crime organizado e as rotineiras mortes com claros sinais de execução em Boa Vista sempre estiveram conectados de alguma forma, construindo um barril de pólvora que se tornou a Segurança Pública de Roraima dentro de um cenário de imigração desordenada, corrupção sistêmica que corre solta até em eleição suplementar no interior e a ausência de políticas públicas direcionada para combater as causas da violência, e não apenas seus efeitos.

Saltando para os momentos atuais, em que Segurança Pública é sempre tratada com imagens de viaturas novas estacionados na Praça do Centro Cívico, o cenário só piorou, com o surgimento de denúncias apontando policiais militares executando pessoas por meio de simulação de confronto, inclusive com suspeita de integrarem milícias, além dos mais recentes casos: policial militar suspeito de executar casal a tiros em questão fundiária, no Cantá, além de outro citado como suspeito de ter matado uma jovem em Rorainópolis. E tudo isso seguido de denúncias de abuso de autoridades e excessos em abordagens policiais.

Há algo de muito estranho diante dos acontecimentos envolvendo policiais. Do caso do avião em 2022 e da bombástica entrevista do delegado em 2023 até chegar aqui,  percebe-se que absolutamente nada mudou na Segurança Pública, com a realidade dos fatos tratada como se nada de preocupante estivesse ocorrendo. E mais estranho ainda é o silêncio das autoridades, comprovando que silenciar sobre fatos ainda é a melhor estratégia de fingir que está tudo bem, enquanto a opinião pública vem sendo distraída com outras coisas.

*Colunista

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