Enquanto a grande mídia distraía o povo com a taxação do presidente estadunidense Donal Trump e polemizando nas redes sociais vídeos produzidos por Inteligência Artificial, os deputados das bancadas da Bíblia, da Bala, do Boi e das Betes se uniram para aplicar o “golpe do licenciamento ambiental”, como está sendo chamada a aprovação do “PL da Devastação”, nesta madrugada. Sob muita confusão e bate-boca, a Câmara Federal aprovou o projeto de lei que flexibiliza as regras ambientais.
Em resumo, o PL permite licença ambiental que poderá ser concedida mesmo para empreendimentos com potencial significativo de degradação ambiental, desde que considerados estratégicos pelo Conselho de Governo. Também cria o licenciamento simplificado por adesão e compromisso (LAC), dispensando estudos de impacto para atividades de pequeno e médio porte. E retira o poder de órgãos como Funai, Iphan e ICMBio de participarem do processo decisório em certos casos, além de reduzir a necessidade de autorização para empreendimentos que afetem unidades de conservação.
Com 267 votos favoráveis e 116 contrários, o PL que foi aprovado nasceu na Câmara há 20 anos, passou pelo Senado com alterações e agora vai para sanção do presidente Lula, que acabou de vetar o projeto de lei que aumentava o número de deputados federais de 513 para 531 a partir de 2027.
Ainda é uma incógnita se o presidente irá vetar ou não o PL da Devastação, uma vez que Lula fez críticas públicas aos órgãos ambientais pela falta de autorização para a realização de pesquisas na exploração de petróleo na Foz do Amazonas, cuja liberação para esse fim é um dos principais objetivos do projeto aprovado pelos deputados federais nesta madrugada.
Para isso, o projeto cria a Licença Ambiental Especial (LAE), um procedimento monofásico para a obtenção de uma licença, que é um rito único com todas as etapas e previsão de prioridade para a emissão de anuências necessárias ao licenciamento. A licença especial se dará para projetos previamente listados pelo Executivo, a exemplo da prospecção de petróleo pela Petrobras na Foz do Amazonas, bandeira do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e seus aliados.
O PL da Devastação também retira a mineração das atribuições do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para os licenciamentos de atividades ou de empreendimentos minerários de grande porte e/ou de alto risco, passando a mineração a seguir o que está previsto na nova lei de licenciamento, ignorando grandes desastres ambientais que ocorreram no país, a exemplo dos casos de desmoronamento de barragem de Brumadinho e Mariana.
Chama a atenção o fato de o PL retirar a necessidade de licenciamento para atividades agropecuárias, bastando que o imóvel esteja regular com registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou bastando assinar um termo de compromisso próprio para recuperação ambiental de reserva legal ou área de preservação permanente. Estarão dispensados ainda do licenciamento as obras de saneamento básico, por meio de procedimentos simplificados e prioridade na análise, desde que seja de interesse do governo.
A nova lei ambiental também permite que o licenciamento possa ser feito pela internet e a renovação automática de licença on-line para atividades ou de empreendimento caracterizado como de baixo ou médio potencial poluidor e pequeno ou médio porte. Da mesma forma que Cria a Licença Ambiental Única (LAU), que é a modalidade de licença aprovada de forma rápida e numa única etapa.
Na mesma medida em que simplifica tudo, o projeto dá prazo para os órgãos ambientais efetuarem licenciamentos, que vão de três a dez a meses, sem que haja um plano de estruturação desses órgãos, que hoje estão sucateados e deficitários em número de servidores para haja uma celeridade nos trabalhos, cujo auge de sucateamento ocorreu no governo anterior, quando foi incentivado o garimpo ilegal e o surgimento de movimentos que protagonizaram incêndios criminosos no país.
Por fim, o PL derrubou o artigo sobre ações imediatas a desastres, quando o relator acatou uma emenda que derrubou o artigo que previa que, em caso de situação de emergência ou de estado de calamidade pública, ações de resposta imediata ao desastre poderiam ser executadas independentemente de licenciamento ambiental. Tudo isso foi aprovado sem discussão com a sociedade, ignorando os alertas da comunidade científica e os tratados internacionais.
Não há dúvidas de que esse será mais um episódio a ser decidido no Supremo Tribunal Federal (STF), que se tornou um poder moderador diante de um país refém de decisões tomadas por um Congresso dominado por ricos que defendem os interesses dos super ricos.
*Colunista
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