JESSÉ SOUZA

Novas operações policiais, mas velhas e sistêmicas práticas na saúde indígena

Os mesmos políticos que historicamente são contra os direitos indígenas são os mesmos que têm loteado a saúde indígena (Foto: Divulgação)

De novidade mesmo apenas o nome da operação, porque o que a Polícia Federal investiga em Roraima, em suas seguidas ações, são práticas antigas, enraizadas nas entranhas dos governos. Nada surpreende. A Operação  Hipóxia, deflagrada ontem, diz respeito a um superfaturamento no contrato para serviços de recarga de oxigênio ao Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI-Y). Mas as suspeitas, os fortes indícios e a execução de esquemas com o dinheiro da saúde indígena não são novos.

No dia 16 de janeiro deste ano, esta Coluna publicou o artigo “O grande desafio da política indigenista que passa pelo comando da Sesai” a respeito do tema. Está escrito lá: “As lideranças que assumiram a política indigenista do governo ainda não têm a real noção do que irão enfrentar na saúde indígena. Trata-se de um imenso abacaxi ainda a ser descascado principalmente quando diz respeito ao Estado de Roraima, cujas nomeações na Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) sempre estiveram nas mãos dos poderosos locais”.

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Os mesmos políticos que historicamente são contra os direitos indígenas são os mesmos que têm loteado a saúde indígena desde o tempo em que o setor era comandado pela extinta Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e que seguiram até os dias atuais com a Sesai. Eles não apenas são responsáveis pelos seguidos escândalos de corrupção como também apoiam o garimpo ilegal nas terras indígenas.

Operações policiais na saúde indígena em Roraima foram recorrentes ao longo dos anos desde o tempo de Funasa, as quais se cruzam com as operações que investigam atualmente o garimpo ilegal na Terra Yanomami. As investigações mostraram um jogo duplo de empresas de táxi aéreo contratadas pela Sesai, as quais se aproveitavam do acesso aos distritos sanitários para fazer voos para garimpos ilegais.

De tempos passados até hoje já houve de tudo: assassinato de empresário de táxi aéreo na disputa por licitação, incêndio da sede do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei-Leste), ameaças a lideranças indígenas, inúmeras manifestações dos povos indígenas e recorrentes denúncias de malversação. Nem mesmo a Operação Metástase, em 2007, que levou 30 pessoas presas, incluindo a alta cúpula da Funasa da época e empresários, meteu medo nos operadores dos esquemas.

Para quem tem memória curta, naquele ano a PF investigou um esquema de desvio de R$34 milhões aos cofres públicos, cujas fraudes eram focadas nas licitações de serviços de transporte em táxi aéreo, contratação de obras de engenharia e aquisição de medicamentos. Naquele tempo, a Funasa concentrava todos os serviços e obras da saúde indígena. Um setor com orçamento bilionário até os dias atuais, o qual é disputado a socos e pontapés pelos políticos locais.

Mesmo com o novo governo, pouca coisa mudou, uma vez que se trata de algo enraizado na saúde indígena, conforme esta Coluna vem reiterando desde sempre. Para se ter uma ideia, em maio deste ano a imprensa nacional divulgou matérias afirmando que mensagens e depoimentos na PF ligam senador roraimense e seu filho ministro a suspeitos de fraude na saúde indígena Yanomami.

Enquanto os indígenas têm suas terras invadidas por garimpeiros, morrem de doenças curáveis e passam fome, um forte esquema sistêmico sempre se apropriou dos recursos públicos destinados à saúde indígena. Há muito ainda a ser passado a limpo…

*Colunista

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