JESSÉ SOUZA

Grandes projetos no Baixo Rio Branco e o desprezo histórico aos ribeirinhos

Moradores do Sítio Serrinha tiveram suas casas destruídas pela fiscalização da Femarh, no Baixo Rio Branco (Foto: Divulgação/Femarh)

O episódio protagonizado pela deputada Joilma Teodora, que foi acometida por um surto de sinceridade no plenário da Assembleia Legislativa, no dia 7 passado, durante uma audiência pública sobre a pesca esportiva do tucunaré, foi apenas mais um capítulo dentro de um grande enredo que envolve a região Baixo Rio Branco, no Sul de Roraima, próximo da divisa com o Estado do Amazonas.

Ao assumir a omissão de todos com a situação de abandono dos ribeirinhos daquela região, inclusive admitindo compra de voto para que os políticos se mantenham no poder a cada quatro anos, a parlamentar tinha intenção de jogar mais penumbra sobre o grande interesse dos “peixes graúdos” com o Baixo Rio Branco, os quais têm o aval do governo estadual. A tática era escandalizar a opinião pública com suas revelações para desviar a atenção.

Os desdobramentos seguem. Bastou o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) suspender uma liminar, autorizando que a Fundação Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Femarh) retomasse as fiscalizações ambientais no Sítio Serrinha, na região do Rio Água Boa do Univini, no Baixo Rio Branco, para que o órgão enviasse uma força-tarefa para a região a fim de destruir as casas dos ribeirinhos, sem que eles tivessem a oportunidade de salvar pertences e retirar animais.

A cena é a dos próximos capítulos, pois toda movimentação visa manter uma política de encurralar ao máximo os ribeirinhos, os forçando a recuar em seus projetos ou mesmo expulsá-los, os quais vivem principalmente da pesca artesanal. Na verdade, eles são considerados o grande empecilho para grandes empresários não só da pesca esportiva, que ganham em dólar trazendo turistas estrangeiros para os seus luxuosos barcos-hotéis, mas também para outras atividades bilionárias.

Não se pode esquecer que a Femarh contratou irregularmente uma empresa pelo valor de R$3 bilhões (sim, três bilhões de reais), a Biosphere Projetos Ambientais S.A (Bipasa), para a venda de créditos de carbono de três reservas ambientais e um parque estadual no Baixo Rio Branco. A ilegalidade era tão visível que o contrato foi cancelado e o diretor da Fundação exonerado (sabe-se que ele não agiu sozinho nessa, considerado o valor bilionário envolvido!)

Enquanto há uma política governamental direcionada a esses grandes empresários, que querem uma região congelada apenas para os seus propósitos e interesses econômicos, os únicos prejudicados são os moradores, os ribeirinhos, que vivem isolados das mais básicas políticas públicas e submetidos à exploração pelos grandes empreendimentos endinheirados e empoderados por apoio político.

A deputada Joilma expôs a realidade daquele povo, submetido à miséria, violência, sem assistência médica e sem ser ouvidos em suas demandas. O exemplo foi o caso dos créditos de carbono, em que o contrato foi formalizado sem consultar as comunidades envolvidas e as do entorno que iriam ser atingidas de alguma forma. É como se elas não existissem ou não tivessem direito à voz. E seguem assim desde sempre, condenadas a serem exploradas por grandes empreendimentos e a viverem no subdesenvolvimento.

Também não custa lembrar que, assim que assumiu o governo após eleito pela primeira vez, a primeira viagem feita pelo governador Antonio Denarium após empossado, em 1º janeiro de 2019, foi visitar os grandes empresários da pesca esportiva no Baixo Rio Branco. Ali já era possível saber qual seria prioridade. Inclusive, no Turismo, a pesca do tucunaré é o principal cartão de visita do governo na atualidade. Não poderia ser diferente.

*Colunista

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