JESSÉ SOUZA

Das ambulâncias e mudas de café aos esquemas atuais nos municípios

Duas prefeituras foram alvos de operações da PF nos últimos dias sob suspeita de fraudes em licitações (Foto: Divulgação)

Nem gera mais comoção na opinião pública roraimense quando a Polícia Federal (PF) bate às portas de prefeituras em operações para investigar esquemas com dinheiro público. Foi assim com os dois últimos casos, um deles na semana retrasada relacionado ao Município de Bonfim, e outro, de ontem, que diz respeito ao Município de Mucajaí.

No primeiro caso, no dia 26 de abril, PF prendeu em flagrante um empresário e dois servidores públicos de Bonfim com cerca de R$ 462 mil, que haviam acabado de ser sacados no banco, em Boa Vista. Os envolvidos são suspeitos de integrar um esquema de fraudes em procedimentos licitatórios na prefeitura.

Nesta quarta-feira, a PF começou o dia com uma operação em Mucajaí que investiga empresários e servidores públicos daquele município acusados de fraudar processos licitatórios para beneficiar empresas que recebiam os valores e repassavam aos envolvidos no suposto esquema, cujo valor da propina chegava a 10% do valor do contrato.

Se houver interesse das autoridades responsáveis por fiscalizar, é só correr atrás do grande duto de emendas parlamentares destinada a prefeituras, que alimenta esquemas desde sempre. Basta observar a lista de destinação de recursos por parlamentares e comparar com os locais onde eles estão brigando pela indicação de candidatura a prefeito ou prefeita.

Não é só em Roraima. É coisa de Brasil. É sujeira da política brasileira. É sem-vergonhice das brabas. Como a memória do brasileiro é curta, basta lembrar da Operação Sanguessuga, em maio de 2006, quando a Polícia Federal começou a investigar o esquema de fraudes em licitações na área de saúde para compra de ambulâncias.

A quadrilha negociava com assessores de parlamentares a liberação de emendas individuais ao Orçamento da União para que fossem destinadas a municípios específicos. Com recursos garantidos, o grupo manipulava a licitação e fraudava a concorrência utilizando empresas de fachada. Os preços da licitação eram superfaturados, chegando a ser até 120% superiores aos valores de mercado.

Ou seja, mudam os deputados, senadores, prefeitos e governadores, só não muda a forma de meter a mão nos cofres públicos. Como a memória é curta, todos já esqueceram que, em Roraima, nos idos anos de 2011, houve a denúncia do esquema das mudas de café no Município de São Luiz do Anauá.

Um parlamentar que até hoje está no poder destinou emenda parlamentar para plantio de café, em que a licitação foi fraudada para que a empresa do irmão do político fosse beneficiada. Os recursos foram liberados, mas nunca uma muda sequer de café foi plantada em São Luiz, no Sul de Roraima.

O que chama a atenção nessa questão de emendas é o fato de tudo ser estruturado para resultar em esquemas, quando o Executivo atribui ao próprio parlamentar o poder de escolher o destino a ser dado aos recursos de sua emenda, inclusive com o acesso do parlamentar direto ao sistema informatizado do governo. Logo, não tem como não resultar em esquemas.

Se os órgãos de controle quisessem, não haveria cadeia suficiente para prender os envolvidos nos esquemas nos municípios.

*Colunista

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