Cotidiano

Morto por coronavírus, jovem ianomâmi gostava de futebol e caça

Alvanei Xirixana, de 15 anos, o primeiro ianomâmi morto após contrair o novo Coronavirus. Foto: Reprodução

Nascido na aldeia ianomâmi rehebe, às margens do rio Uraricoera, em Roraima, o adolescente Alvanei Xirixana, 15, primeira vítima da etnia pelo Coronavirus, estudava em uma escola na terra indígena Boqueirão, área habitada pelos povos macuxi e wapichana, de cultura e língua diferentes.

Alvanei morava havia dois anos no Boqueirão, no município de Alto Alegre (RR). O motivo da mudança era continuar os estudos do ensino fundamental. Ele também vivia sob os cuidados de uma liderança macuxi, que mantinha boas relações com a aldeia de origem do estudante.

O intérprete de idioma indígena Paulo Xirixana, 22, irmão de Alvanei, explica que o ato de falar o nome de um parente morto é um tabu na cultura ianomâmi, que pode significar desrespeito.

“Ele foi para a mesma escola que eu. Quando terminei [os estudos], voltei para a comunidade e depois com o apoio da nossa mãe o incentivei a estudar e seguir carreira como médico ou advogado”, relata.

Alvanei era tímido, de poucas palavras e atento às aulas. Gostava de férias porque podia se divertir tomando banho no rio, brincar e pescar com os parentes e amigos da aldeia natal, formada por 75 pessoas.

Os dois compartilhavam o gosto pelo futebol. Alvanei torcia pelo São Paulo e à equipe vencedora era entregue como prêmio uma garrafa contendo uma bebida fermentada de batata-doce. O time tinha até nome: Beirão Uraricoera.

O estudante também gostava de caçar, segundo o irmão. “Quando o [nosso] pai não acompanhava, ele ia sozinho para a floresta. Era bom de flecha, trazia muita caça boa”, afirma Paulo.

Com a saúde frágil e após uma série de idas e vindas ao sistema público, Alvanei morreu no Hospital Geral de Roraima na noite de 9 de abril. Foi a terceira vítima indígena da doença registrada no país.

Os pais do estudante, Alfredo e Soraya Xirixana, estão em isolamento na Casa de Saúde Indígena (Casai) Yanomami, em Boa Vista, apesar de terem sido testados para a Covid-19 e o resultado ter sido negativo.

Para o vice-presidente da associação Hutukara, Dário Kopenawa Yanomami, Alvanei foi vítima de xawara, palavra que representa ‘epidemia’. “Para nós, Coronavirus é xawara. É a visão dos nossos ancestrais de várias doenças: pneumonia, gripe, malária, tudo o que te deixa fraco. A gente não buscou isso, mas como o homem da cidade está destruindo a natureza, a xawara está¡ avançando no mundo inteiro, inclusive nas nossas terras com os garimpeiros”, diz Dário. 

As informações são do jornal Folha de São Paulo.

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