Política da cesta básica colocada em prática desde a década de 1980
Independente do que ocorra com os processos de cassação do governador Antonio Denarium no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), é necessário fazer uma reflexão sobre a forma de se fazer política em Roraima, que sempre foi impactada pela farta distribuição de cesta básica, seja por meio de programas sociais ou mesmo de práticas explicitamente assistencialistas, quando se colocavam as famílias na fila para receber buchada de boi, frango (na época era chamado de galeto) e peixe desde a década de 1980, ainda no tempo de Território Federal.
Tal prática assistencialista, que veio desde o tempo em que sequer havia eleições diretas, tornou-se uma ação deliberada para influenciar no resultado das eleições depois da emancipação do Estado de Roraima, em 1985, a partir de quando as campanhas eleitorais eram turbinadas com filas quilométricas para o povo receber as benesses governamentais. A prática segue até os dias atuais, conforme mostram as decisões da Justiça Eleitoral em Roraima.
O Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RR) não só cassou mandatos de prefeitos do interior de Roraima sob acusação de compra de votos por meio de distribuição de cestas básicas, como também cassou Denarium por ter feito farta distribuição de cesta básica nas eleições passadas, que se tornou o marco que expos a prática assistencialista disfarçada de programas sociais destinadas às famílias de baixa renda.
Para se ter uma ideia dessa realidade, no ano de 2021 foram três prefeitos cassados sob a mesma acusação de abuso de poder econômico por terem feito distribuição de cesta básica aos eleitores. Um deles, o então prefeito de Alto Alegre, Pedro Henrique Machado. Além de cassado no caso das cestas básicas, ele chegou a ser preso pela Polícia Federal durante operação que investigava suspeita de um esquema de fraudes em licitações.
Outro cassado foi o então prefeito de Pacaraima, Juliano Torquato por ter distribuído cestas básicas e brindes em período proibido pela legislação eleitoral. O então prefeito de São Luiz do Anauá, James Batista (SD), foi outro cassado por ter promovido distribuição de cestas básicas, além de dinheiro e de viagens para idosos que faziam parte de um projeto social do município.
No caso do governador, as provas mostraram-se contundentes, a começar quando o programa Cesta da Família foi criado em janeiro de 2022, após mudança de nome do programa social já existente em governos anteriores, quando foi turbinado o número de beneficiários, saltando de 10 mil para 50 mil inscritos durante o ano eleitoral, conforme apontam os processos eleitorais.
O mesmo programa social havia sido alvo da Polícia Federal nas eleições municipais de 2000, com apreensão de fichas cadastrais no dia 8 de novembro, após denúncia de deputados de oposição sobre suspeita de crime eleitoral para beneficiar a candidatura a prefeito apoiado pelo governo. No dia 14 seguinte, a PF apreendeu 10 mil cestas básicas que supostamente seriam usadas para a compra de votos.
Embora Denarium tenha sido cassado quatro vezes, ocorreram outros casos no passado, a exemplo da cassação por abuso de poder econômico e político do então governador Flamarion Portela (chefe da Casa Civil de Denarium). A cassação foi confirmada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2004, sob a acusação der ter aumentado o valor do Vale Alimentação (o embrião do Cesta da Família) e de ter concedido anistias e parcelamento fiscais.
Como é possível notar, a política da cesta básica sempre foi um fator determinante na política roraimense, em que os eleitores sempre se deixaram levar por uma prática de receber algo em troca do voto. Inclusive houve um tempo em que se montava uma “feira-livre do voto” nas madrugadas que antecediam as eleições, uma prática que foi abolida com o endurecimento das fiscalizações e da legislação eleitoral.
Quem sabe a Justiça Eleitoral um dia consiga mudar essa realidade, já que o povo mostra-se suscetível a estas práticas ilegais a cada período eleitoral, sem se preocupar com as consequências que isso possa provocar. E ano que vem já teremos novas eleições, inclusive com a política de distribuição de cesta básica já turbinada e com recursos previsto em orçamento.
*Colunista