Não fossem as ações da Operação Acolhida, em parceria com a Agência das Organizações das Nações Unidas (ONU) para as Migrações, a OIM, a situação dos migrantes venezuelanos que buscam recomeçar a vida no Brasil a partir de Roraima, a situação seria muito pior. Sem conhecer essa realidade que se passa desde que os migrantes chegam ao território brasileiro pelo Município de Pacaraima, Norte do Estado, muitos ignoram a importância das ações humanitárias realizadas pelo governo brasileiro e a OIM.
Quando os venezuelanos atravessam a fronteira, começam as ações da Operação Acolhida, com o imprescindível trabalho da OIM, a qual dá início à reposta humanitária ao fluxo venezuelano. A partir daí, os migrantes recebem os encaminhamentos para formalizarem o pedido de residência no Brasil e iniciam uma nova fase de vida, quando as famílias são orientadas sobre a Estratégia de Interiorização, que é uma ação que permite que os venezuelanos aceitem voluntariamente ir de Roraima para outras cidades brasileiras a fim de ingressarem no mercado de trabalho.
Para se ter uma ideia da extensão dessa atividade, desde abril de 2018 até o fim de junho deste ano, foram cerca de 150 mil venezuelanos interiorizados para mais de 1.100 cidades brasileiras de diversas regiões. Os dados são da pesquisa denominada de “A estratégia de interiorização para refugiadas, refugiados e migrantes da Venezuela no Brasil: construindo evidências para informar a formulação de políticas responsivas ao gênero”, conduzida pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), ONU Mulheres e o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), com o apoio do Governo de Luxemburgo.
De 2021 a 2023, foram entrevistados 1.415 venezuelanos interiorizadas e residentes em abrigos em Boa Vista. Os entrevistados destacaram crescimento na renda e no emprego das mulheres venezuelanas, no entanto, os dados mostram que as mulheres seguem em desvantagem no acesso a direitos básicos em relação aos homens, o que se tornou o principal desafio das autoridades e entidades envolvidas nas ações de interiorização. A divulgação dos dados da pesquisa foi feita no dia 07 passado, na Fundação Oswaldo Cruz, em Brasília.
Analisando esses dados com os números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que apontam que a população venezuelana atualmente forma o maior grupo estrangeiro no Brasil, com 271,5 mil pessoas, surge o grande desafio: a maioria das pessoas interiorizadas expressa o desejo de permanecer no Brasil, o que significa que é imprescindível o prosseguimento da estratégia de interiorização. No entanto, é necessário que o trabalho seja acompanhado de políticas públicas robustas e sensíveis às desigualdades de gênero integradas e atentas para a inclusão social e laboral dessas pessoas, conforme destaca o resultado da pesquisa.
Com parceira da interiorização, a OIM oferece apoio em todas as etapas do processo, incluindo entrevistas, contato com empresas e entidades receptoras, revisão documental, sessões informativas pré-embarque e acompanhamento até o destino final das pessoas. A organização também apoia diretamente com as passagens comerciais, tendo adquirido mais de 21 mil bilhetes nos últimos anos em reforço aos voos proporcionados diretamente pelo Governo Federal. A entidade mantém ainda atividades de saúde, proteção e integração local dentro da Operação Acolhida
É sobre isso que as autoridades brasileiras precisam estar atentas para que um ônus maior não recaia sobre Roraima, que já sofre as consequências da diáspora venezuelana. Sem a Operação Acolhida, teria sido um caos sem precedentes. Até aqui, o que se tem notado em relação às autoridades locais, é que só se toca no assunto migração quando se trata de cobrar uma dinheirama em compensação pelos gastos do Estado com a imigração, desde o governo anterior. O atual governo aponta que o valor devido pela União seria de R$ 306 milhões.
Pelo menos a pesquisa sobre a interiorização já é de conhecimento das autoridades federais, uma vez que a apresentação dos dados ocorreu durante uma oficina técnica com servidores públicos de diferentes ministérios e órgãos federais, em Brasília. Falta agora a classe política local e as autoridades estaduais estarem cientes de que é preciso fazer algo mais além do que cobrar compensação financeira. Porque, se a Operação Acolhida falhar, a população de Roraima é quem sofrerá as graves consequências de imediato.
*Colunista