Por Walter Landio dos Santos, advogado em Maricato Advogados Associados, especialista em Direito Médico e da Saúde.
O STF vai se debruçar e julgar pautas sobre temas de repercussão geral e, entre eles, a Constitucionalidade da Lei que amplia a lista de procedimentos em saúde da ANS, fruto da RN 465/2021.
A referida lista é editada pela ANS com o objetivo de organizar e delimitar, por exemplo, a cobertura mínima em procedimentos de saúde que as operadoras deverão atender quando o beneficiário necessitar. Tal cobertura mínima é elencada com mais de 3.000 procedimentos (isso em 2021) e, vem sendo atualizada, como se pode notar pela Consulta Pública 154 da ANS publicada em 04 de abril de 2025. É um número muito grande de procedimentos em saúde e que se torna muito difícil para o consumidor em geral conhecer.
Sobre o assunto inclusive já pontuou a Ministra do STJ Nancy Andrighi no Resp 1876630/SP, julgado em 2021, que: “Não é razoável impor ao consumidor que, no ato da contratação, avalie os quase 3.000 procedimentos elencados no Anexo I da Resolução ANS 428/2017, a fim de decidir, no momento de eleger e aderir ao contrato, sobre as possíveis alternativas de tratamento para as eventuais enfermidades que possam vir a acometê-lo”.
Mas a ANS tem competência para isso?
Tem sim, por força da Lei Federal 9.961, de 2000 que cria a Agência Nacional de Saúde e lhe confere competência para atualizar periodicamente a lista de procedimentos e eventos em saúde que as operadoras estão obrigadas a cobrir. E até antes da edição da RN 465, o STJ entendia que o rol era exemplificativo, porém teve que mudar seu entendimento onde a 4.ª Turma ao julgar o Resp 1.733.013, tornando-o taxativo.
A partir dessa mudança de entendimento criou-se uma polêmica que atinge tanto os órgãos de proteção e defesa do consumidor quanto os de tutela dos direitos das operadoras de planos de saúde, que, por seu turno, dizia que não teria “carta branca” para atender a toda e qualquer exigência do consumidor de plano de saúde que não constasse do aludido rol, senão estaria fadada à insegurança e à falência.
Por outro lado, difícil seria a situação do consumidor que não tem como controlar seu organismo a fim de evitar algum tipo de doença que, muitas vezes, nem ele sabe que tem. Cada pessoa, cada organismo reage de forma diferente. Seres humanos não podem, de maneira alguma, ser reduzidos a uma lista clínica de saúde padronizada.
Caso você precise de uma cirurgia que utiliza técnica em robótica, por exemplo, será recusado pela operadora por não constar da lista da ANS.
E com isso surgiu a dúvida: o rol da ANS é taxativo ou exemplificativo?
Nós aqui já nos posicionávamos no sentido de que o tratamento do beneficiário de plano de saúde deveria sim ser atendido pela operadora diante de uma prescrição bem embasada pelo médico que o assiste e por força do que recomenda a Lei de Planos de Saúde ao dispor sobre o chamado plano-referência.
Porém, surgiu então a Lei Federal n.º 14.454, de 2021, que alterou a Lei de Planos de Saúde para estabelecer que o rol de procedimentos em saúde da ANS é referência básica e, principalmente: em caso de tratamento ou procedimento indicado pelo médico do paciente não constar do aludido rol a cobertura deverá ser autorizada pela operadora quando houver comprovação de sua eficácia baseada em evidências científicas ou haver recomendação pelo CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema de Saúde Suplementar), órgão este de apoio ao sistema Judiciário e operadores do direito.
Dessa forma, a referida lei tornou exemplificativo o rol da ANS, desde que se atendam aos requisitos objetivos nela descritos.
O nosso entendimento é a favor da tese do rol da ANS ser tido como exemplificativo, porque se coaduna com princípios já reconhecidos pelo nosso ordenamento jurídico, mormente o da dignidade da pessoa humana e contrário a tratamento degradante.
Além do mais está de acordo com o que determina a Lei de Planos de Saúde ao estabelecer no plano-referência (artigo 10), que toda e qualquer doença listada pelo CID-10 deve ser de cobertura obrigatória, por constituir assistência à saúde do beneficiário, ratificando o entendimento de que o termo “assistência” inclui todas as ações necessárias à prevenção da doença e à recuperação, manutenção e reabilitação da saúde.
Portanto, é o médico que, diante de um laudo demonstrando a eficácia científica do tratamento com recomendações de órgãos técnicos, que vai dizer o que é melhor para o paciente e ponto final.
Se o rol da ANS é taxativo ou exemplificativo, o que interessa é o direito primordial à saúde da pessoa humana como objetivo que se busca no contrato de plano de saúde.