Cotidiano

Venezuelanas voltam para ponto de prostituição após operação da PF

O Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual disse que há anos Roraima é rota do tráfico de pessoas e de exploração sexual, mas que não há ação efetiva por parte das autoridades para coibir esses crimes

Apesar da operação Polícia Federal (PF), desencadeada na última quinta-feira, 4, que investiga a existência de uma rede de tráfico de mulheres brasileiras e venezuelanas para fins de exploração sexual no Estado, nas primeiras horas da manhã do sábado, 6, as esquinas, calçadas e meio fio da Avenida dos Imigrantes, onde fica localizada a Feira do Passarão, no bairro Caimbé, zona oeste, estavam tomadas de mulheres aguardando clientes. A operação foi nomeada “Codinome”, mas ficou conhecida como “Oitchenta”, devido ao valor cobrado nos programas, pelas venezuelanas.

O Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente e o Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual revelou que há muitos anos Roraima é rota do tráfico de pessoas, da violência, exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes e que a Operação apenas confirmou as denúncias que as entidades fizeram ao longo dos anos.

“Já tínhamos alertado. Vamos muito ao interior e a gente sabe de tudo, porque as pessoas denunciam. Tem denúncia nas Vilas, nos Assentamentos, nas Vicinais. A gente sabe de denuncias de exploração sexual, a gente sabe que acontece tráfico de pessoas dentro do Brasil, dentro de Roraima, nos municípios e em outros países, e agora, ainda mais com as venezuelanas”, explicou Ivone Salucci, vice-coordenadora do Comitê Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual.

O Comitê apurou que as mulheres chegam ao Brasil por meio de promessas falsas de aliciadores. “Estivemos na Feira do Passarão há dois meses. Entramos em contato com as mulheres, conversamos com elas. Muitas vieram para o Brasil por conta própria, outras foram trazidas, aliciadas. Os aliciadores dizem para elas que irão para um lugar bom, ganhar muito dinheiro, mas quando chegam aqui descobrem que foram enganadas. A situação também é bastante degradante quanto ao lugar onde elas ficam”, disse.

As instituições também apontam que por estarem no Brasil ilegalmente, muitas mulheres omitem os casos de violência, deixando de procurar a polícia. “Várias venezuelanas relataram casos de violência para a nossa equipe. Violência de pessoas que as colocam para fazer programa dentro de um carro e depois espancam, não querem pagar o programa. Para ficarem aqui, acabam submetendo-se à condições sub-humanas”, observou Salucci.

No que se refere à rede de prostituição, as entidades enfatizam que não foi surpresa a operação da Polícia Federal, porque não há nenhum fato novo. “A cidade toda sabe disso. Quem trabalha na área de violência sexual recebe denúncia o tempo todo. Ouvimos as pessoas comentarem, só que é preciso que haja políticas públicas e atenção a esses grupos de pessoas. É preciso que haja também um trabalho da segurança pública intensificado, como teve agora com a operação da Polícia Federal. Mas, a PF faz a operação e depois que a poeira baixa, tudo volta como antes. Esse é o problema do Brasil”, ressaltou a vice-coordenadora do Comitê.

MENORES – Além das mulheres, menores estão sendo cooptados para a prostituição. “Isso é fato em Roraima há muito tempo, tanto com os meninos travestis, quanto as meninas. Há uma rede de aliciamento muito grande. Os aliciadores estabelecem um percentual de ganho, de modo que elas ficam com o mínimo e eles ficam a maior parte”, salientou Salucci.

Quanto às investigações, o Comitê disse que não descarta a possibilidade de mulheres de outros estados da federação e da Guiana estarem inseridas nas zonas de prostituição, no entanto, o maior número é de venezuelanas. “Em Roraima as pessoas estão criando atitudes xenofóbicas e de discriminação em relação a essas mulheres, sem entender todo o contexto. A situação socioeconômica que vive a Venezuela obriga essas mulheres a se submeterem a essas condições como último refúgio para não morrer de fome. A sociedade roraimense precisa ser mais solidária e entender que são pessoas humanas precisando de amparo, de apoio”, disse Ivone.