Cotidiano

Desembargador solta e outro mantém prisão de ex-presidente

O presidente do TRF-4, Carlos Thompson Flores, apoiou o desembargador Gebran Neto, que questionara decisão de Rogério Favreto

No vai e vem de despachos, ao longo desse domingo, 8, desembargadores e juízes da Lava Jato travaram queda de braço em torno da situação do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. O episódio expôs divisões do Judiciário em meio ao embate político que divide o país.

O conflito colocou em lados opostos um desembargador de plantão no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) crítico da Lava Jato e outros magistrados da mesma corte, além do juiz Sérgio Moro.

No início da tarde, o desembargador Rogério Favreto, que foi filiado ao PT por 19 anos, surpreendeu políticos e juristas ao acatar monocraticamente pedido de liminar apresentado por um grupo de deputados petistas. Segundo a primeira decisão de Favreto, Lula deveria ser solto ainda no domingo.

Foi o início de uma queda de braço entre o desembargador e outros juízes, como Sérgio Moro. A questão parecia ter chegado ao fim duas horas depois, quando a liminar foi suspensa por ordem do relator do processo de Lula no TRF-4, o desembargador João Pedro Gebran Neto. Pelo entendimento de Gebran Neto, Favreto não tinha competência para tomar decisão solitária sobre o caso.

Mesmo assim, Favreto reiterou sua decisão original, ignorando o despacho de Gebran Neto. Pouco depois das 16h, determinou que a PF soltasse Lula em até uma hora.

Isso colocou a PF diante de decisões conflitantes, tomadas por dois desembargadores da mesma hierarquia. Os agentes preferiram aguardar.

No final, o presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores, após ser acionado pelo Ministério Público Federal, decidiu pouco antes das 20h que a palavra final sobre o caso não cabia ao desembargador de plantão, mas ao relator do caso. Com isso, Lula permaneceu preso.

1ª DECISÃO 

Os deputados que impetraram o habeas corpus – Wadih Damous, Paulo Pimenta e Paulo Teixeira – parecem ter calculado estrategicamente a data da apresentação do pedido. Favreto era o único desembargador de plantão no TRF-4 durante o fim de semana. Além disso, o juiz Sérgio Moro, responsável pela condução da Lava Jato em Curitiba, onde o petista permanece preso, estava de férias. O pedido foi apresentado 30 minutos após o início do plantão do desembargador.

Na justificativa da decisão, Favreto apontou que Lula deveria ser solto para garantir a isonomia das eleições e que o petista não poderia ser impedido de fazer campanha, já que ainda não teve os direitos políticos suspensos.

O desembargador considerou também como “fato novo” para embasar a soltura do ex-presidente a condição do petista como pré-candidato à Presidência, apesar de Lula ter anunciado sua intenção de concorrer já no passado e que tal fato não havia sido aceito pela 8°Turma do TRF-8, pelo STF e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Junto com a decisão, ele emitiu um alvará de soltura. Os deputados autores do pedido já estavam em frente à sede da Polícia Federal em Curitiba para pressionar pela saída do ex-presidente quando o alvará foi divulgado pela imprensa.

A GUERRA 

Foi nesse momento que o juiz Sérgio Moro, apesar de estar de férias, se manifestou para tentar derrubar a decisão. Em despacho, declarou que Favreto era “incompetente” para tomar qualquer decisão monocrática sobre o caso.

Moro, que trabalha em sintonia com a Polícia Federal desde o início da Lava Jato, pediu que os agentes não soltassem Lula até o relator do processo de Lula no TRF-4, Gebran Neto, se manifestar sobre a concessão.

Favreto, no entanto, reiterou sua ordem de soltura à PF em Curitiba. “O cumprimento do alvará de soltura não requer maiores dificuldades e deve ser efetivado por qualquer agente federal que estiver na atividade plantonista, não havendo necessidade da presença de delegado local”, disse em despacho.

Pouco depois, o relator do caso, Gebran Neto, finalmente se manifestou. Ele suspendeu a liminar de Favreto e determinou que o pedido de HC fosse encaminhado a seu gabinete. Apontou que Favreto foi “induzido a erros pelos impetrantes”.

Gebran Neto entendeu que Favreto havia extrapolado seu poder e eventual pedido de HC não deveria ter sido aceito e analisado por um juiz de plantão, mas pela 8ª turma ou por um tribunal superior.

Parecia ter acabado o suspense sobre se Lula seria solto ou não. No entanto, Favreto decidiu ignorar Gebran e determinou pela terceira vez que o ex-presidente deveria ser solto – desta vez em uma hora. Ele também contestou a afirmação de que era incompetente para analisar o HC. Em entrevista à Rádio Guaíba, disse que o relator só teria competência para julgar a sua decisão após o fim do plantão, na segunda-feira.

A última decisão sobre o caso do petista foi tomada pelo presidente do TRF-4, Thompson Flores, que apoiou o desembargador Gebran Neto. Apontou que a pré-candidatura de Lula não era “fato novo” e deveria ser mantida a decisão da 8ª Turma que determinou a prisão do petista em abril.

Politicamente, o vai e vem que no final acabou não mudando a situação de Lula foi comparado por comentaristas da imprensa com a anulação da votação do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em maio de 2017.