Cotidiano

Cada vez mais conectadas, crianças e adolescentes criam seu próprio mundo

Há alguns anos, o grande vilão para a educação das crianças era a televisão, hoje é a internet e os jogos eletrônicos. Cada vez mais conectadas à tecnologia, a geração digital acaba descuidando do estudo e do lazer. Especialistas afirmam que a tecnologia não é vilã nem mocinha, o segredo é o uso adequado, mas, para muitos pais, esse limite é difícil de impor.

Para Emanuel Dorval, sete anos, a separação entre real e virtual é quase imperceptível. Se os pais deixarem, ele passa o dia inteiro conectado. A mãe, Maíra Guimarães Magalhães de Alencar, 38, conta que esse mundo virtual foi apresentado muito cedo para o filho, antes mesmo dos quatro anos, quando ganhou um tablet da avó paterna. Mas a maior influência vem do pai, que é da área da computação.

“Ele está realmente muito ligado nessa questão da informatização, os jogos principalmente. O vício dele agora é esse tal de Minecraft. Ele realmente acredita que está criando um mundo, e se a gente deixar passa o dia inteiro na frente da televisão”, diz a mãe.

Mas nem sempre foi assim. Maíra conta que o filho, até os cinco anos, interagia mais, pedia para a mãe contar histórias e juntos, criavam um mundo de faz de contas. “O momento de leitura para ele era o melhor. Quando ele começou a ler, que descobriu as palavras adorava estar ali me mostrando: ‘Mãe, mãe, olha o que eu descobri, a palavra tal’. Eu percebia que ele tinha essa vontade de descobrir o mundo pela leitura. Mas logo depois esse mundo passou a ser chato, para ele”, relatou.

Quando os pais perceberam que o mundo virtual estava afetando a vida social do Emanuel resolveram radicalizar, tirando o tablet e restringindo os dias de jogos. O menino, que já fazia aulas de Kumon e Karatê, passou a ter aulas de natação. “Emanuel sempre foi muito inteligente, é o primeiro da turma, os jogos não interferem no aprendizado dele, mas houve uma melhora na questão da interação com as pessoas, no contanto com outras crianças”, disse a mãe.

“Estamos tentando canalizar essa paixão pelo virtual para um lado positivo. Queremos colocar ele num curso de robótica, quem sabe não surge algum gênio por aí? É o tempo todo essa luta, de mostrar para ele que ele é uma criança, que tudo tem seu tempo, que o vídeo game é bom, que a internet realmente é uma ferramenta maravilhosa, mas que tem que ser usado de maneira correta”, ponderou Maíra.

PSICOPEDAGOGA – De acordo com a psicopedagoga Jussara Barbosa, as crianças aprendem ou desenvolvem o gosto por essas práticas, tanto assistir televisão ou acessar internet e jogos eletrônicos a partir do adulto, ou os pais ou a pessoa que cuida dessa criança, e muito cedo.

“Pra você ter uma ideia, não se recomenda no período da primeira infância, até três, quatro anos, que a criança tenha acesso, tanto à televisão, quanto à internet ou jogos eletrônicos, jamais. O adulto, por conta de uma necessidade, acaba introduzido muito cedo no desenvolvimento da criança, esses instrumentos, criando uma situação e um hábito que irá interferir no desenvolvimento psicológico, social e inclusive, psicomotor dessa criança”, alertou Jussara.

Ainda de acordo com a psicopedagoga, a criança tem tido como seu companheiro, como o outro, como quem ela imita, o aplicativo, o tablet. O outro da criança passou a ser o tablet não mais a referência humana.

“O ideal do nascimento até os três, quatro anos, é que ela tenha contato com jogos pedagógicos, o lúdico e que também tenha contato com a leitura, a partir da contação de histórias, que é realizado pelos pais ou a pessoa que cuida. Pra desenvolver a linguagem, a expressão, a compreensão”, enfatizou a psicopedagoga.

E para que o mundo virtual não interfira no rendimento escolar, de acordo com a psicopedagoga, é “necessário que seja um projeto familiar, uma proposta familiar, onde todos irão interagir com essa escola, participar, para que a criança passe a ter uma relação com o aprender, positiva, e não algo que venha pra diminuir o tempo dela diante de outras atividades muito mais interessantes que a internet oferece”, destacou.

“A introdução da internet deve ser feita sim, pela família, mas no momento que a criança aprende a finalidade, a utilizar a internet com um propósito que não seja ficar em redes sociais ou então em joguinhos”, completou a psicopedagoga. (L. D.)