Cotidiano

Venezuelanos moradores de rua receberão aluguel e alimentação

Proposta foi apresentada juntamente com várias medidas para auxiliar a crise migratória de venezuelanos em Roraima

Depois de apresentar a nove ministros do Governo Federal, em Brasília, uma proposta de plano de trabalho como solução para a problemática de migração desordenada de venezuelanos em Roraima, a prefeita de Boa Vista, Teresa Surita (PMDB), anunciou uma série de medidas para controle e auxílio aos estrangeiros que vivem na Capital.

O pacote de ações foi implantado após o número de pedidos de refúgio para Roraima de venezuelanos que fogem da grave crise política, econômica e social no país vizinho e aumentar mais de 50% entre junho e julho deste ano. A estimativa é que mais de 30 mil venezuelanos tenham deixado a Venezuela para viver no Estado.

A Prefeitura destacou problemas sociais decorrentes da migração desenfreada de venezuelanos no Estado, como o surgimento de doenças já erradicadas no país, a depredação de espaços públicos, a crescente demanda na rede municipal de ensino e nos hospitais, o aumento nos níveis de violência e a prostituição.

Entre as principais medidas anunciadas em coletiva de imprensa realizada no Palácio 9 de Julho, na manhã de ontem, 24, está a oferta de um aluguel solidário pelo período de seis meses para milhares de venezuelanos não-índios que estão em situação de rua. Os custos, que não foram revelados pelo município, ainda incluiriam a alimentação dos estrangeiros.

A ideia, que começará a valer a partir do dia 12 de setembro e será subsidiada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA), é repassar o valor dos alugueis entre R$ 700 e R$ 1.200 a imobiliárias que concederão residências a famílias de até sete pessoas pelo período temporário. Os indígenas venezuelanos não estariam inclusos porque, segundo o Município, não trabalham.

Segundo a prefeita, ainda não há um cálculo para saber quantos estrangeiros devem ser beneficiados. “Não sabemos a quantidade de pessoas, mas o Governo Federal já está esperando tanto a relação das pessoas dos aluguéis solidários como a das pessoas que queiram sair de Boa Vista”, disse.

Além do auxílio moradia e de alimentação aos estrangeiros, foi discutido também durante a coletiva o controle do fluxo de entrada dos migrantes com a exigência de apresentação de carteira de vacina na fronteira entre Brasil e Venezuela, em Pacaraima.

A recepção dos venezuelanos na fronteira com a implantação de um posto de recepção e triagem com a montagem de uma estrutura do pelotão de fronteira do Exército Brasileiro em Pacaraima foi outro tema abordado. A unidade contará com o apoio do Ministério da Saúde, Polícia Federal, Fundação Nacional do Índio e Prefeitura do Município.

Em Boa Vista, será criado um Centro de Atendimento ao Migrante (CAM), que funcionará no prédio do antigo terminal do Caimbé, na zona oeste. No local, serão disponibilizadas salas e estruturas para realização de encaminhamentos que devem ser feitos pelo Município, Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Receita Federal.

Desde a quarta-feira, 23, a Prefeitura também iniciou um recenseamento para determinar o número de habitantes venezuelanos na Capital. Somente no primeiro dia e em apenas um ponto de Boa Vista, mais de 90 famílias foram cadastradas.

Os custos de todas as ações prometidas pelo Município no auxílio aos estrangeiros não foram levantados. “Não fomos pedir dinheiro ao Governo Federal, mas levamos um plano de trabalho porque eles não conhecem a nossa realidade. Mostramos a dificuldade de controle e, quando levamos as sugestões, elas foram aceitas e iremos implantar e ajustar”, afirmou Teresa.

Questionada se o “pacote de bondades” da Prefeitura aos venezuelanos não atrairia mais migrantes ao Estado, a prefeita declarou que isso ocorrerá de qualquer maneira. “Essas pessoas virão de qualquer forma, mas claro que serão estimuladas com atendimento digno. Se chegar a um número absurdo a proposta é limitar a entrada, que não é fechar a fronteira, mas agora se não tomarmos atitude, iremos perder tudo que construímos”, afirmou.

Perguntada sobre o motivo de só após um ano e meio do início da migração desenfreada de venezuelanos para o estado de Roraima a Prefeitura estar anunciando as ações de ajuda aos estrangeiros, Teresa afirmou que o Município nunca esteve ausente. “Demos atendimento como qualquer outra pessoa que mora na cidade. Nós fomos procurados porque não estava tendo ações de outros órgãos e pediram para que interviéssemos de forma eficiente”, frisou.

Conforme o Município, todas as ações serão subsidiadas pela Casa Civil da Presidência da República e pelos ministérios da Justiça, do Trabalho, da Defesa, do Desenvolvimento Social e das Relações Internacionais.

NÚMEROS – Conforme balanço divulgado pela Prefeitura, a maioria dos venezuelanos que migra para Roraima é de Caracas, capital do país vizinho. Mais de 58% são homens e jovens entre 22 e 25 anos. A maior parte deles são estudantes (17,93%), seguidos por engenheiros (6,21%), médicos (4,83%) e economistas (7,83%).

O impacto na rede municipal de educação com a migração desenfreada de venezuelanos foi destacado. Em apenas um ano, entre 2016 e 2017, o número de matrículas nas escolas municipais aumentou mais de 300%, passando de 123 para 513 alunos distribuídos em 63 unidades de ensino. Isso equivale a uma escola de grande porte da Prefeitura somente com venezuelanos.
 
Prefeitura quer levar estrangeiros para o interior e outros estados

Um acordo com a Força Aérea Brasileira (FAB), conforme o Município, também teria sido fechado, com a disponibilização de um avião para levar os venezuelanos que não quiserem permanecer em Roraima a outros estados, como São Paulo, que já tem um centro de acolhimento a estrangeiros. “Fizemos acordo com a FAB de disponibilizar avião para eles irem para outros centros fora e dentro de Roraima. Temos várias opções, mas precisamos organizar primeiro o que está acontecendo”, explicou a prefeita Teresa Surita.

Conforme Teresa, muitas pessoas querem sair de Roraima, mas não têm dinheiro. “Daremos a oportunidade de eles irem a São Paulo, onde já existe o centro onde foram atendidos os haitianos e de lá irão para outros lugares. A questão do interior é dar possibilidade de emprego a pessoas capacitadas para que aumente as opções que possam ter”, destacou.

Consultada pela reportagem, a Força Aérea Brasileira, porém, afirmou que, até o momento, não recebeu nenhum pedido de transporte de venezuelanos de Boa Vista para outras regiões do País. (L.G.C)

Pacaraima também terá abrigo para os venezuelanos

Um abrigo para receber os estrangeiros também será montado em Pacaraima, na fronteira com a Venezuela. A reforma da unidade, que funcionará no antigo prédio do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) do Município, tem previsão para iniciar na próxima semana. O local irá abrigar os indígenas Warao que ficarão separados dos demais venezuelanos e terá ventilação e iluminação adequadas, controle permanente de entrada e saída do abrigo, alimentação, na periodicidade de três vezes ao dia.

À Folha, o prefeito de Pacaraima, Juliano Torquato, considerou tardias as medidas do Governo Federal para tentar solucionar a crise migratória. “É um pouco tarde, porque estamos com mais de oito meses de gestão e, após vários diálogos, várias apresentações, relatórios e visitas que tivemos de ministérios tivemos vários problemas e sabemos que não vão passar agora”, afirmou.

Apesar disso, o gestor não escondeu a preocupação com o iminente aumento de estrangeiros no município, que fica a apenas 18 quilômetros de Santa Elena de Uairén, na Venezuela. “Se aumentar, iremos entrar em situação de emergência. Mesmo assim colocamos a mão na massa para que as coisas aconteçam o mais rápido possível. Iremos usar os ministérios que estão envolvidos para que as coisas fluam”, ressaltou. (L.G.C)