Política

Romero Jucá é apontado em esquema de corrupção em Angra 3

Material já está sob análise da PGR

Relatório da Polícia Federal (PF) enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF) apontou indícios de corrupção passiva por parte do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Romero Jucá (PMDB-RR) e outros senadores também do PMDB em esquema para favorecer a empreiteira UTC nas obras da usina de Angra 3.

Procurados, os ministros negaram irregularidades. A defesa de Jucá negou o envolvimento do político. “O relatório da PF é a prova mais evidente de que existe hoje uma criminalização da política”.

A PF enviou relatório no começo do mês passado, assinado pela delegada Graziela Machado da Costa e Silva. O material já está sob análise da Procuradoria Geral da República (PGR), a quem cabe decidir se denuncia ou não os suspeitos. Só em caso de denúncia aceita pela Justiça os investigados viram réus.

O caso está sendo investigado desde junho de 2015 e tem como base a delação premiada do dono da empreiteira UTC, Ricardo Pessoa. Ele relatou aos investigadores que recebeu um pedido de dinheiro de Tiago Cedraz. O empreiteiro disse ainda que Cedraz deixou “antever que a importância solicitada, no valor de R$ 1 milhão, seria ao ministro Raimundo Carreiro, do Tribunal de Contas da União, relator do processo de Angra 3 no TCU”.

Outros delatores da Lava Jato – da Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Odebrecht – confirmaram o esquema e envolveram também Aroldo Cedraz.
Na delação, Ricardo Pessoa afirmou que, após o pagamento de R$ 1 milhão a Tiago Cedraz, não houve problema com o contrato de Angra 3 no TCU. Nas palavras dele, “tudo fluiu”.

No relatório, a PF também aponta telefonemas em meio ao processo sobre a usina de Angra 3 que, segundo o documento, demonstra o tráfico de influência de Tiago Cedraz no tribunal de contas.

Além disso, os senadores envolvidos atuaram em defesa das empresas em troca de vantagens indevidas, segundo a Polícia Federal.

A delegada afirmou que os políticos aceitaram valores “pelo simples fato de serem integrantes da cúpula do partido que controlava o Ministério de Minas e Energia, com influência suficiente para interferir negativa ou positivamente na contratação ou execução de contratos firmados naquela seara”.

Segundo ela, o STF, no processo do mensalão, entendeu que para configuração de corrupção não há necessidade de um ato de ofício certo ou determinado, um ato específico de contrapartida.

Em relação a Jucá, a PF aponta, além dos indícios de corrupção passiva, também os de lavagem de dinheiro.

“A solicitação de doação eleitoral feita em 2014 por Romero Jucá Filho e José Renan Vasconcelos Calheiros, abatida do montante estipulado por Edison Lobão, como ministro de Minas e Energia e liderança do PMDB em conjunto com os demais, e Ricardo Pessoa, como representante da empresa líder do consórcio Agramon, vencedor do processo licitatório para realização de obra de montagem eletromecânica da Usina de Angra 3, configura as condutas típicas de corrupção passiva e lavagem de dinheiro”, diz o relatório.

“Ficou claro que os senadores foram remunerados pela representatividade dentro do PMDB e deste no Ministério de Minas Energia, ao qual estava vinculada a Eletronuclear, a quem o consórcio liderado pela empresa de Ricardo Pessoa havia firmado contrato para execução de obras da Usina Nuclear de Angra 3”, afirma a PF no documento.

Segundo o relatório, também “restou demonstrada” a participação de Tiago Cedraz e dos ministros do TCU no esquema para favorecer as empresas.

“Quanto ao núcleo de apuração relativa ao Tribunal de Contas da União, também restou demonstrada participação ativa do advogado Tiago Cedraz, que mantinha notável influência e acesso a assessores e ministros daquela Corte, bem como dos ministros Aroldo Cedraz e Raimundo Carreiro, na solicitação de vantagens indevidas em decorrência da atuação nos processos de interesse de Ricardo Pessoa”, diz outro trecho do relatório.

Para a delegada, “foram colhidos indícios suficientes de que a articulação buscada por Ricardo Pessoa, através de Tiago Cedraz, surtiu efeito”. Ela listou como justificativa “a dinâmica do andamento processual na Corte de Contas e o comportamento dos ministros Aroldo Cedraz e Raimundo Carreiro”.

Entenda – A montagem eletromecânica da usina foi orçada em R$ 3,1 bilhões em 2012 e, segundo delatores da Lava Jato, servidores da Eletronuclear (como o ex-presidente Othon Luiz Pinheiro da Silva) e parlamentares do PMDB pediram propina de 1%.

Segundo a PF, o valor da propina – que poderia chegar a R$ 30 milhões – não foi integralmente repassado.
Isso ocorreu porque, em 2014 – mesmo ano em que foi deflagrada a Lava Jato –, executivos das empreiteiras consideraram que, se a ex-presidente Dilma Rousseff não fosse reeleita, poderia se alterar “todo o cenário político” no Ministério de Minas e Energia, controlado à época pelo PMDB.

As investigações conseguiram identificar a entrega de R$ 1 milhão para o senador Edison Lobão (PMDB-MA) em 2014, em espécie, como caixa 2 para a campanha eleitoral.

A delegada considerou, no entanto, que Jucá e Calheiros também são suspeitos de corrupção, por terem solicitado doação eleitoral oficial à UTC Engenharia, que seria abatida do montante reservado a Lobão.

O Tribunal de Contas da União enviou a seguinte nota:

“O TCU esclarece que o número associado à maioria das ligações registradas no citado relatório da Polícia Federal se trata de ramal geral da recepção do Gabinete do Ministro Raimundo Carreiro. O TCU reforça que ligações de e para escritórios de advocacia são procedimentos usuais e corriqueiros em gabinetes de quaisquer tribunais, em virtude de solicitação de informações sobre pedidos de sustentação oral, estágio de processos, pedidos de vista e cópia, pedidos de audiência, expedição de certidões (que não são enviadas mediante ofício, sendo retiradas pessoalmente por quem as requereu) e outros requerimentos processuais.

O contato com escritórios de advocacia por servidores de gabinetes e unidades técnicas do TCU não caracteriza nenhuma anormalidade, por se tratar de rotina comum de trabalho, para garantir o pleno exercício da ampla defesa e do contraditório das partes e de seus representantes legais.”

Fonte: O Globo