Cotidiano

Judiciário atende índios Waimiri Atroari com Unidade Móvel

Ação insere 44 servidores e magistrados do Amazonas, Roraima e Rio de Janeiro

O Programa Justiça Itinerante do Amazonas e Roraima está atendendendo 800 indígenas ao longo desta semana. O serviço envolve unidades móveis no Núcleo de Apoio aos Waimiri Atroari (Nawa), localizada no quilômetro 258 da BR-174.

Com uma equipe de 44 servidores, incluindo os de instituições parceiras, o Judiciário providencia aos indígenas o serviço de expedição de Certidão de Nascimento, RG, CPF, conversão do Rani (Registro Administrativo de Nascimento Indígena) em Registro Civil e retificações de documentos, dentre outros serviços.

Wakié José Porfírio, com apenas 45 dias de vida, é o 2000º índio da etnia Waimiri Atroari e um dos mais de 800 que receberão atendimento do programa Justiça Itinerante, iniciado neste segunda-feira (26).

A presença da criança, filha de Wetxie Waimiri e Wakixi Vanilda, é carregada de simbolismo, pois representa o ‘renascimento’ da etnia, que já registrou mais de 3 mil índios na década de 70, mas que foi reduzida a apenas 374 em 1987, após a construção de rodovia (BR 174, que liga Manaus a Boa Vista), hidrelétrica e empreendimentos de mineração na região dos waimiri atroari, localizada na fronteira entre os Estados do Amazonas e Roraima, conforme os índios.

O pequeno Wakié José Porfírio, além de outras dezenas de crianças, estão entre os índios que serão beneficiados com a expedição de Certidão de Nascimento em uma ação inédita do Poder Judiciário, iniciada na segunda-feira (26) em prol dos waimiri atroari e que será desenvolvida até o dia 3 de março – em uma primeira etapa -, pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), em parceria com os Tribunais de Justiça de Roraima (TJRR) e do Rio de Janeiro (TJRJ) e Governo do Amazonas.

Mário Parwé, líder das 49 aldeias Waimiri Atroari e que vivenciou a quase extinção de seu povo, observa as providências do Poder Judiciário como uma ‘janela’ para a liberdade. “Liberdade pois com documentos como Certidão de Nascimento e RG poderemos ter acesso, por exemplo, a serviços emergenciais de saúde na ‘cidade’ quando assim necessitarmos. Hoje, esses serviços nos são negados pela simples ausência de documentação”, disse.

O líder máximo dos Waimiri-Atroari perdeu a esposa em meados da década de 1990, acometida por sarampo e acrescenta que a comunidade está em festa por esta nova perspectiva e ressalta o respeito dos tribunais em planejar conjuntamente com os indígenas a ação. “Fomos ouvidos e pudemos informar nossa real necessidade. Isso muito nos alegra”, completou.

Kiawe Alexandre Atroari foi um dos indígenas que teve a Certidão de Nascimento expedida já no primeiro dia de atendimento na reserva, na última terça-feira (26). Com o documento em mãos, ele comemora a providência. “Era um desejo de nossa comunidade e acredito que muitas portas serão abertas”, destacou.

Ao saber da oportunidade que seria oferecida pelo Poder Judiciário, os índios intensificaram a carga horária de aulas em suas escolas, dentro da área indígena, para que não errassem seus nomes nas cédulas de RG, de acordo com informações obtidas pelos juízes.

Solenidade – Nesta segunda-feira (26), os trabalhos do Judiciário, na terra indígena, foi iniciado com uma solenidade aberta oficialmente pelo presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas, desembargador Flávio Pascarelli; teve ainda a participação da presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Roraima (TRE-RR), Tânia Maria Vasconcelos; da coordenadora dos Juizados Especiais Federais do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF-1), Gilda Sigmarina Seixas; do juiz da 6a. Vara Federal, Alan Minori; dos juízes coordenadores do Justiça Itinerante do TJAM e Roraima, Alexandre Henrique Novaes e Erick Linhares, respectivamente.

Prestigiaram, também, a solenidade as juízas de Direito do TJAM, Rebeca de Mendonça Lima e Dinah Câmara; os juízes do TJRJ André Britto, Cláudia Motta e Lysa Maria Figueira; a vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Amazonas (OAB-AM), Adriana Mendonça; o promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de Roraima (MPE-RR) Valdir Aparecido; o defensor público do Estado de Roraima Stélio Denner; o deputado estadual Carlos Alberto de Castro Almeida (PRB); e o presidente da Câmara Municipal de Manaus, vereador Wilker Barreto (PHS).

Na solenidade, além dos discursos das autoridades e de lideranças Waimiri Atroari, aproximadamente 40 índios saudaram os presentes com canto e dança, apresentando e exaltando sua cultura e tradições.

Cidadania – “Conferir cidadania ao povo Waimiri Atroari na medida em que eles também querem essa cidadania”. Nas palavras do presidente do TJAM, desembargador Flávio Pascarelli, este será o principal legado da ação do Judiciário em prol dos indígenas dessa etnia. “Temos, enquanto sociedade, uma dívida com os povos indígenas, no entanto, hoje, realizamos um ato concreto de respeito e valorização ao povo Waimiri Atroari que após serem dizimados – tendo seu contigente populacional reduzido de 3 mil a pouco mais de 300 habitantes, estão, agora retomando a vida, retomando direitos e sendo melhor compreendidos pela sociedade”, afirmou o desembargador Flávio Pascarelli.

Para a coordenadora dos Juizados Especiais Federais do TRF-1, Gilda Sigmarina Seixas, ao favorecer a cidadania aos povos indígenas, o Poder Judiciário cumpre uma de suas missões institucionais. “A visão institucional do Poder Judiciário é o de ser reconhecido pela sociedade como um instrumento efetivo de Justiça, equidade e paz social, com a credibilidade e reconhecimento por ser um Poder célere, acessível, responsável, efetivo e justo garantindo às pessoas o direito pleno do exercício à cidadania”, afirmou.

Já o secretário de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Amazonas e que na ocasião representou o governador do Estado, Amazonino Mendes, lembrou a importância das parcerias institucionais em prol da população.

“Salientamos que serviços como os que esta semana são providenciados, são ofertados com muito maior eficácia quando existe a conjugação de esforços. O atendimento à etnia Waimiri Atroari terá essa característica”, salientou o secretário.

Ineditismo e perenidade – O juiz coordenador do orojeto Justiça Itinerante do TJRR, Erick Linhares, frisou o caráter inédito do atendimento. “Da parte de Roraima, já realizamos atendimento a uma gama de etnias que residem em nosso território – como aos índios que vivem na reserva Raposa Serra do Sol -, mas da forma que hoje passa a ser realizado, com três tribunais estaduais envolvidos, é a primeira vez que ocorre no Brasil. É, portanto, um trabalho inovador, com resultados práticos aos indígenas, e que servirá de parâmetro para futuras ações do Judiciário”, comentou.

O juiz coordenador do Justiça Itinerante pelo TJAM, Alexandre Henrique Novaes, acrescentou que os serviços serão realizados de forma perene em favor da comunidade Waimiri Atroari. “Atenderemos nesta semana (de 26 de fevereiro a 3 de março), no entanto já temos uma nova agenda de atendimento na primeira semana de abril, onde beneficiaremos os indígenas da mesma etnia que residem em área fluvial e nos comprometemos a retornar, ao menos, uma vez por ano para dar continuidade a essa ação e dar cumprimento a novas demandas”, anunciou.

Conforme o juiz Alexandre Novaes, nesta primeira rodada de serviços, aproximadamente 800 indígenas devem ser atendidos “e na segunda, em abril, nossas equipes estarão preparadas para o mesmo contingente”, informou.

À frente, há mais de dez anos, do projeto Justiça Itinerante do TJAM, o juiz Alexandre Novaes mencionou o apoio irrestrito do presidente da Corte, desembargador Flávio Pascarelli, e a colaboração dos Poderes Executivos e Legislativo do Estado do Amazonas à iniciativa do TJAM, cuja equipe, segundo o magistrado, visita, anualmente, todas as zonas da cidade de Manaus e municípios do interior.

‘Gente de Verdade’ – Autodenominados ‘Kinja’ (pronúncia Quinhá – que significa ‘gente de verdade’ na tradução livre para a língua portuguesa), os Waimiri Atroari comemoram neste ano, com o nascimento de seu 2000º índio, a retomada de seu crescimento populacional após um passivo de décadas.

Conforme o coordenador Educacional do programa Waimiri-Atroari, Walter Blos, o momento é de festividade. “Até a década de 1970, a população registrava aproximadamente 3 mil indígenas. A partir do primeiro contato (com o homem branco), naquela época, com a construção da BR-174, da Hidrelétrica de Balbina e das obras de mineração, registrou-se uma redução anual de aproximadamente 20% daquela população, chegando a apenas 374 pessoas em 1987, ano em que foi fundado o programa Waimiri Atroari, com medidas mitigadoras empreendidas pela Eletronorte e Fundação Nacional do Índio (Funai)”, explicou Blos.

A iniciativa dos Tribunais de Justiça reforçam, segundo Walter Blos, o ideário do programa Waimiri Atroari e consolida o crescimento da etnia.

Com informação da Ascom/ Amazonas

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