Cotidiano

Grupo de 30 pessoas denuncia golpe imobiliário praticado por empresa

Conforme denúncia, empresa fazia venda de terrenos e negociava construção da casa própria, mas negócios não foram concretizados

Cerca de 30 pessoas registraram Boletim de Ocorrência no 1º Distrito Policial e formalizaram denúncia no Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR) alegando prejuízo causado por uma construtora de imóveis em Roraima. Conforme os denunciantes, o prejuízo pode chegar a R$ 10 milhões.

Segundo o relato dos envolvidos, as pessoas firmaram contrato com a empresa, localizada na Avenida Getúlio Vargas, no Centro, com o objetivo de aquisição de terrenos ou construção da casa própria em diversos pontos da cidade, a maioria em áreas de bairros nobres da Capital. Os valores dos imóveis ficavam na faixa de R$ 100 mil até R$ 1 milhão, em algumas ocasiões.

Durante a negociação, os contratos foram elaborados e assinados por uma pessoa que se dizia diretor executivo da construtora e piloto da Base Aérea da Capital, acompanhado de uma mulher que se apresentava como secretária-geral da empresa. Uma das vítimas relatou que, em duas ocasiões, uma terceira pessoa também foi apresentada como diretor operacional e chefe da companhia.

O golpe, no entanto, não foi o mesmo aplicado para todas as vítimas. Algumas relataram que compraram terreno pertencente a outras pessoas que não sabiam da venda do lote, outras que souberam que seus terrenos estavam sendo comprados por terceiros e, ainda, algumas que deram entrada para construção de casas, mas as obras não iniciaram ou eram interrompidas. A informação é que as empresas que prestavam serviço para a construtora e forneciam material para realização das casas também ficaram sem receber.

“Fizemos o contrato de aquisição e construção em junho e demos R$ 70 mil de entrada. Fizemos o projeto com o rapaz da própria construtora e, quando foi para dar entrada na Caixa Econômica Federal, eles começaram a enrolar. Aí fomos descobrir que eles estavam atrasando todas as obras e não estavam começando as que já estavam com alvará. Falamos com a secretária e disseram que era só uma crise e que iriam construir nossa casa e que nosso processo já estava na Caixa. Com isso, fomos na Caixa saber do nosso processo e descobrimos que eles nunca deram entrada”, relatou uma das vítimas.

“Fomos ao Cartório de Imóveis e descobrimos que o terreno que ele nos vendeu não era dele. O dono disse que tinham roubado o terreno dele e tinha conseguido reaver o terreno. Ou seja, estavam vendendo um terreno sem autorização. Agora entramos com advogado para tentar reaver o dinheiro, o que é muito difícil”, explicou uma das pessoas, que preferiu não se identificar.

Outra denunciante explicou que teve prejuízo de R$ 82 mil. “A gente contratou a construtora para construir a casa do zero, mas o terreno já era nosso. Demos a entrada, só que nunca começou. Eles sumiram. Todos os dias eu tento entrar em contato com eles, mas eles ignoram as ligações e as mensagens. Nós fomos à sede da empresa várias vezes. Eles não aparecem mais por lá, parece que ela está aberta só de fachada”, frisou.

Conforme o relato, os negociadores diziam que faltavam documentos para completar a obra. “Desde o começo ficavam dizendo que faltava o alvará para começar a obra e, quando eu entreguei o alvará, foi a última vez que os vi, faz mais de um mês. Disseram que iam atrás de mais documentos e eu confrontei, dizendo que não havia mais documentos, porque tenho ciência de como funciona o processo. Para outras pessoas, com pouca informação no assunto, eles estavam enrolando”, complementou.

“Com essa informação eu fiquei receosa e conversei com um amigo próximo. Descobrimos, por pessoas em comum, que ele não era a pessoa que dizia ser e que havia outras pessoas envolvidas nesse problema. Resolvemos fazer um grupo no WhatsApp e daí fomos formalizar o boletim”, acrescentou.

MAIS VÍTIMAS – Em outro relato, um denunciante disse que fez a negociação para construção de uma casa em um terreno diretamente com o diretor executivo, e não com a construtora. “Eu tinha um terreno e ia construir, mas ele vendeu o meu imóvel como se fosse dele, só que não dei autorização, nem procuração, nem documento de transferência. Ou seja, foram duas pessoas prejudicadas, eu e quem comprou, achando que estava fazendo um bom negócio”, afirmou.

A vítima acredita que o prejuízo pode passar de R$ 10 milhões, no total. “Tem muita gente que foi penalizada e que preferiu não correr atrás do prejuízo. As 30 pessoas que assinaram o Boletim de Ocorrência foram só as que quiseram, porque tem muita gente que não quis se meter”, acrescentou.

A Folha tentou contato com a construtora, porém, não obteve resposta dos envolvidos.

EMPRESA – A Folha tentou contato com os envolvidos através do telefone da empresa e celular pessoal, um deles com DDD de Tocantins, além do e-mail. Todos os contatos estavam disponibilizados nos cartões profissionais entregues às vítimas. No entanto, as chamadas via celular e mensagem por WhatsApp não foram respondidas. Um dos e-mails disponibilizados foi relatado como não existente.

A Folha também tentou contato na sede da empresa e foi informada, por um dos funcionários, que a secretária estaria de férias. Outra funcionária disse apenas que “somente trabalhava na empresa” e que não poderia dar informações sobre os proprietários. A equipe de reportagem também tentou contato pelas redes sociais, porém, a página da empresa no Facebook não respondeu às mensagens e o site da construtora está fora do ar.

Caso ganha repercussão e Ala 7 diz que não há denúncia formalizada

Uma das vítimas do golpe imobiliário disse que o principal negociador da empresa se apresentava como piloto da Base Aérea, muito possivelmente com o intuito de ganhar a credibilidade das pessoas. Porém, fontes da instituição militar revelaram que ele seria sargento no setor administrativo da Força Aérea Brasileira.

“A nossa preocupação é porque chegou a informação, na semana passada, de que ele teria conseguido transferência. A gente está correndo contra o tempo para que ele não seja transferido, porque a gente sabe que vai ficar muito mais difícil para ele ser penalizado. O dinheiro a gente sabe que não vai mais recuperar, mas o que a gente quer mesmo é que ele não faça mais esse tipo de coisa novamente com outras pessoas”, frisou uma das vítimas.

REPERCUSSÃO – Durante discurso na Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR), o deputado estadual Joaquim Ruiz (PTN) chegou a comentar sobre o caso. O parlamentar disse que tentou contato com o alto comando da instituição militar, junto com o deputado Chico Mozart (PRP), porém, não foi recebido.

“Pela credibilidade da farda que usa, muitas famílias acreditaram nele. O mais absurdo é que esse cidadão conseguiu três meses de licença médica, atestado assinado pelos médicos da Base Aérea, alegando estar com problemas psíquicos. Ocorre que, durante este período de licença médica, enganou mais de 12 famílias. Isso é grave, muito grave!”, destacou o deputado.

“Quando procuramos o comandante da Base é porque queríamos relatar esses fatos. Não quero acreditar que o alto comando da Base Aérea de Boa Vista está passando a mão na cabeça de quem está extorquindo as famílias de Boa Vista. Várias famílias já denunciaram, mas ainda não vi uma posição firme da Base Aérea. É lamentável que um sujeito desse nível fique mostrando para a opinião pública tudo que não presta, de uma corporação extremamente respeitada, cujo trabalho social e de segurança das nossas fronteiras é do maior nível”, complementou Ruiz.

BASE AÉREA – Em nota, a Base Aérea informou que o Comandante da Ala 7 foi procurado, no dia 1º, por meio de documento oficial de um parlamentar da ALE, para falar sobre o caso e que o pedido foi prontamente atendido.

“No entanto, a Ala 7 não recebeu qualquer documento que formalizasse uma denúncia contra algum militar da organização, o que impossibilita a abertura de processo criminal ou disciplinar. Todavia, caso venha a receber alguma notificação, atuará dentro da sua esfera competente, na estrita observância dos trâmites e processos legais previstos no âmbito do Comando da Aeronáutica”, ressaltou.

Com relação à possibilidade de transferência, a Base informou que não tem registro de solicitação de transferência do militar em questão. Enfatizou que a Ala 7, integrante do Comando da Aeronáutica, preza pela transparência na condução de suas atividades e promove entre suas fileiras uma conduta moral, ética e profissional exemplar diante da sociedade. (P.C.)