Cotidiano

“União precisa rever o frágil controle na fronteira”, diz Suely

Governadora terá hoje audiência com a ministra Rosa Weber e pretende relatar o que viu em Pacaraima

A governadora Suely Campos se reúne hoje, 19, em Brasília, com a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, relatora da ação que pede efetiva atuação do Governo Federal para o enfrentamento da crise migratória e o fechamento da fronteira com a Venezuela. Ontem, a chefe do Executivo Estadual passou o dia em Pacaraima, para inspecionar a situação da fronteira.

Acompanhada dos representantes da cúpula de segurança, da saúde e do prefeito de Pacaraima, Juliano Torquato, Suely Campos esteve na Delegacia da Polícia Federal, onde conversou com a delegada responsável e constatou que continuam ingressando entre 600 e 800 venezuelanos por dia em Roraima.

No posto de vacina instalado pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e pela Secretaria Estadual de Saúde, a governadora verificou que a vacinação ainda não é exigida. “Tive acesso às estatísticas de atendimento e por dia são vacinadas em média 150 a 200 pessoas, ou seja, um terço de quem ingressa no país. É uma situação que continua nos preocupando muito, pois estamos enfrentando uma epidemia de sarampo, que já matou três pessoas”, disse.

A comitiva também esteve no Hospital Délio Tupinambá e no posto de saúde do município. A governadora conversou com os funcionários e com a população que aguardava atendimento e constatou que quase a totalidade da demanda é de imigrantes. Nas duas unidades de saúde, o suprimento de medicamentos não atende o aumento da procura pelos serviços de saúde.

O último local visitado foi o posto da Secretaria da Fazenda (Sefaz), onde o Exército Brasileiro instalou a única barreira em toda extensão da BR-174, desde a linha de fronteira até Boa Vista. Ali os imigrantes que passam em táxis ou ônibus são cadastrados em uma planilha, mas nem todos os veículos são abordados.

“Na fila na Polícia Federal, encontramos muitas pessoas doentes, inclusive pacientes com câncer que estão em tratamento em Boa Vista. É fato que a maioria dos imigrantes vem para Roraima em busca de atendimento médico e de trabalho. O Governo Federal precisa rever o frágil controle que vem exercendo na fronteira e farei um relato minucioso sobre essa inspeção para a ministra Rosa Weber, durante a audiência agendada para esta quinta-feira”, disse.

O prefeito Juliano Torquato também participará da audiência. “Nossa cidade cresceu três vezes em população num curto período de tempo. Mesmo com o apoio do Exército, ainda existem muitos pontos cegos na fronteira e nós não temos recursos financeiros e nem de pessoal para lidar com os reflexos da imigração desenfreada”, afirmou.

Maioria das crianças venezuelanas entra ilegalmente

Grande parte das famílias venezuelanas que tem buscado refúgio no Brasil, por meio da fronteira com a cidade de Pacaraima, tem optado por atravessar ilegalmente suas crianças, por trilhas entre serras que ficam no entorno da barreira. Isso porque, para entrarem legalmente no Brasil, as crianças venezuelanas precisam estar acompanhadas dos pais ou responsáveis e portar algum documento oficial, seja a carteira de identidade ou a certidão de nascimento.

“Ao chegarem à Polícia Federal, esses imigrantes descobrem que precisam dos documentos para obter a permissão de entrada das crianças no Brasil. Como eles não têm como custear a emissão da documentação, acabam optando por atravessar as crianças de maneira irregular”, disse um agenciador da fronteira, que não quis ser identificado.

Ele explicou que alguns imigrantes já chegam ao entorno da aduana brasileira procurando pelos atravessadores, conhecidos como coiotes. “A gente que está aqui todos os dias já sabe da realidade. Necessitados por fugir da crise na Venezuela, eles contratam esse serviço, em que pagam de R$ 20 a R$ 30 por pessoa e são conduzidos por esses coiotes pela região de mata até logo depois de todas as barreiras de fiscalização. De lá seguem a pé ou pegam um táxi rumo a Boa Vista”, ressaltou o trabalhador da Aduana.

A imigrante A.R.S., de 36 anos, caminhava pela estrada nas primeiras horas da manhã de ontem. Com dois filhos pequenos, a venezuelana afirmou ter entrado no país de forma irregular porque estava sem a documentação das crianças. “Nós não tínhamos como voltar pra Venezuela, não tem alimentos, não tem nada. Juntamos tudo o que tínhamos e conseguimos atravessar por meio das trilhas durante a madrugada”, revelou.

A.R.S. afirmou que o governo venezuelano tem tratado com intransigência aqueles que manifestam o interesse de sair do país. “Quando você decide sair, todas as portas se fecham. Então, só nos resta encontrar outra maneira. Agora, estamos indo para Boa Vista em busca de uma nova vida”, concluiu.

No posto de fiscalização da Polícia Federal, a professora Iris Mercedes detalhou as dificuldades sofridas na busca de sair do país legalmente. “Não é possível tramitar a documentação que permite a saída da Venezuela. As certidões de nascimento das crianças têm que ser solicitadas com o mínimo de três meses de antecedência, mas a entrega pode demorar muito mais. Acontece que muitas vezes as pessoas não têm mais como esperar por tanto tempo e, acabam vindo para o Brasil sem os documentos”, revelou.

Mercedes relatou que a situação para tirar ou renovar o passaporte é semelhante. “As pessoas que precisam de um novo documento ou renovar o antigo, simplesmente não conseguem, porque não há material para emissão. A espera é muito longa e não temos condições de esperar”, contou.