Opinião

Opiniao 31 07 2018 6669

Órfã de pai vivo – Antonio de Souza Matos*

Aninha acabara de completar 3 anos. Não sabia que o pai havia abandonado a família. Pensava que ele saía para trabalhar toda vez que se despedia depois de uma visita relâmpago. Numa noite fria, ele apareceu, e o coraçãozinho da menina palpitou e aqueceu-se de contentamento.

Assim que ele entrou em casa, ela se acomodou nos braços dele, como de costume. No entanto, mal ele se sentou no sofá, começou a teclar no celular, deixando a criança desapontada. Embora não soubesse o que estava acontecendo entre os pais, ela desconfiava de que alguma coisa não ia bem, pois não os via mais trocar beijos nem abraços. E, toda vez que ele entrava em casa, a mãe se refugiava no quarto.

Naquela noite, Aninha parecia estar intrigada com esse distanciamento dos pais. Ela lembrou que os dois costumavam deitar-se com ela, sorrir um com o outro e contar-lhe muitas histórias. Sentia falta desses momentos. Por isso, insistiu para que o pai fosse até o quarto, mas ele deu uma desculpa esfarrapada. Disse que estava muito ocupado e continuou teclando com a amante.

A garota ficou impaciente. Foi até o quarto, sentou-se num banquinho, de frente para a parede, e segurou o queixo com as duas mãozinhas. Ficou assim por um bom tempo, pensativa. Depois, retornou à sala decidida.

– Pai, vem comigo! – disse estendo-lhe a mão direita.

– O papai não pode agora, meu bem!…

– Por que, papai?!…

–Papai está muito ocupado, querida!…

Aninha respirou fundo, deu meia volta e retornou ao quarto. A mãe, absorta, nem notou a aflição da filha. A garota sentou-se novamente no banquinho e, desta vez, além de segurar o queixo com as duas mãozinhas, balançou a cabeça várias vezes. Algumas lágrimas começaram a rolar pela face da criança. Chorava baixinho. Era como se entendesse que a mãe sofria e não quisesse agravar-lhe a dor.

Depois de alguns minutos, a mãe, finalmente, notou o que estava acontecendo. Controlou-se para não deixar transparecer a aflição.

– O que você quer, querida?!…

– Por que o papai não vem contar história pra mim?! Por que não vem deitar com a gente?!…

– Calma, meu amor! Ele vem, sim! É que agora está ocupado… Por que você não vem deitar-se com a mamãe?…

– Eu quero o papai!… Eu quero o papai!…

Não podendo convencer a filha, a mãe foi até a sala e contou ao ex-marido o que estava acontecendo. Ele, então, foi até o quarto e fingiu que tudo estava bem. Deitou-se com as duas. Os três sorriram, tiraram fotos com o celular e, claro, o pai contou algumas histórias para a filha – as de sempre. Depois de meia hora, a pobrezinha adormeceu. O rostinho brilhava de alegria.

Na manhã do dia seguinte, acordou mais uma vez sem o pai.

*Professor e revisor de textos. E-mail: [email protected]

Fora “rouaneteiros” – Marlene de Andrade “Deus retribuirá a cada um conforme o seu procedimento”. (Romanos 2:6) A Lei Rouanet 8.313/91 foi criada para “incentivar” a cultura no Brasil e “estimular” os artistas e suas respectivas artes culturais. Essa Lei recebeu esse nome em homenagem ao seu criador Sérgio Paulo Rouanet, professor universitário, filósofo e membro da Academia Brasileira de Letras desde 1992. Ele foi Secretário de Cultura do Governo do Ex-Presidente Collor , o qual teve que sair pela porta dos fundos do Palácio do Planalto, após sofrer impeachment.

Collor sancionou essa lei instituindo o “Programa Nacional de Apoio à Cultura/ PRONAC”, a fim de “incentivar” as políticas públicas para a cultura nacional “decolar”. Ocorre que a lei Rouanet só beneficia artistas ricos, sendo assim, cabe uma pergunta: até quando vamos ser enganados? Se essa lei fosse cumprida à risca, o teatro de Boa Vista não teria se tornado um belo de um “elefante branco”.

Para receber esse benefício o candidato envia uma proposta ao Ministério da Cultura, a qual deve passar pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura/CNIC. Se a proposta for aprovada o projeto pode captar recursos para desenvolver o plano do artista, mas eu quero ver é uma pessoa pobre e lá da periferia ganhar algum apoio dessa lei, pois quem ganha sempre são os artistas milionários e o porquê disso? Através dessa lei os artistas ricos e famosos ajudam os políticos corruptos, pois desse modo, esses artistas divulgam o nome deles em seus shows e tanto isso é verdade, que a maioria dos artistas que defendem o PT e seus aliados já foram muito beneficiados por essa sórdida aliança política traiçoeira.

Afirmar que essa lei incentiva à cultura é mentira deslavada e o que é grave é que esses projetos são realizados à custa do contribuinte e qual é o artista que esteja se beneficiando dessa lei vai ter coragem de desmascarar os políticos corruptos? E tem mais, esses projetos artísticos aprovados sempre são no Sul e no Sudeste do Brasil, pois é lá que estão concentrados os artistas “barões” e enquanto isso o SUS e todas as políticas públicas no Brasil não funcionam.

Como podemos perceber os artistas “rouaneteiros”, se beneficiam da Lei Rouanet sem precisar e isso é crime de lesa pátria. E tem mais um detalhe: o Ministério da Cultura não fiscaliza a execução dos recursos e sabe desde quando essa lei tem beneficiado artistas corruptos? Desde 2001 e eles são tão imorais que têm a coragem também de fazer shows para festas de casamento de famosos e dar shows em eventos privados. Essa roubalheira tem que acabar, já.

*Médica Especialista em Medicina do Trabalho

Memórias do Barão – Walber Aguiar*

Meninos viram homens, mas sempre serão meninos.

Eram os idos de 70. Meninos e meninas desfilavam os uniformes escolares pelas ruas largas e verdes de Boa Vista. Alunos do velho colégio São Francisco, do Monteiro Lobato, do GEC, do São José, o colégio das madres e do velho Barão de Parima, que em 1966 era chamado de GOT, Ginásio Orientado para o Trabalho.

E que trabalho. Eram centenas de adolescentes que atravessavam a cidade debaixo de muito sol. Um verdadeiro Deus nos acuda no momento de atravessar a velha ponte de madeira sob o Igarapé do Caxangá, pois balançava e sempre tinha um menino mais afoito querendo derrubar os outros só pra ver a queda.

Todo mundo usava um jalecão bege, pois era preciso mexer com artes gráficas, tinta, terra, flores, frutas e verduras. Além disso, também tínhamos contato com propaganda, madeira e técnicas comerciais.

Brincar na quadra, comer coco babão e paquerar as meninas fazia parte do currículo extraclasse, pois ali naqueles corredores quase assombrados, o vento nos açoitava feito os cavalos selvagens do Maruai, na terra de Macunaima.

Era lindo viver e aprender a ser gente, a ser menino, a ser homem de bem, com ética, alegria e uma leve responsabilidade. Aprender com o professor Catossi e o velho Jaceguai as técnicas de alguma profissão, junto com os segredos da vida e a ser possuidor de uma alma extremamente sensível.

Ora, temos que preservar os velhos grupos escolares da infância, dos jogos escolares, da disputa entre GEC e Monteiro Lobato, das tradições sadias e cheias de ludicidade. Afrânio Peixoto não existe mais. Barão de Parima, a lendária escola do Calungá, vizinha de Raimundo Nonato da Conceição, o famoso Canguru, da banda de música, e dona Áurea, professora, pais do carismático professor Laulimã, já figurou na lista das escolas extintas. Graças ao bom senso e à grandeza dos moradores do bairro, a Escola Estadual Barão de Parima continua a existir com ensino de qualidade.

Não poderia ter sido extinta mesmo, pois Barão de Parima é o nome dado ao tenente coronel Francisco Lopes Xavier de Araújo, o bravo que chefiou uma expedição até o Monte Roraima. Um bravo nunca pode cair, pois como dizia o poeta negro Paulo Colina: “resistir nunca será um equívoco”.

Ainda vejo aqueles meninos e meninas indo para o GOT, com o desejo de que a vida seja sempre uma espécie de passeio, uma inesquecível brincadeira de criança, onde o caminho da escola é o caminho da liberdade e do conhecimento, da cidadania e da esperança. Meninos, eu vi…

*Advogado, poeta, professor de filosofia, historiador e membro da Academia Roraimense de Letras. [email protected]

Obras primas e monstros – Afonso Rodrigues de Oliveira*

“Todas as artes produziram obras primas. A arte de governar só produziu monstros.” (Saint Just)

Ele teve suas razões pra dizer isso. Eu sou mais maneiro. Mas não posso ser conivente. E estou preocupado com o que pode acontecer nas próximas eleições. Estou vendo muita gente alardeando a anulação do voto, em outubro. Não sei se isso é uma solução inteligente, ou se é uma demonstração de decepção. Mas tudo bem. Cada um na sua. Não tenho nada a ver com isso. Mas seria mais inteligente analisarmos o problema com mais maturidade. Se você deixa de votar num candidato por achar que ele não merece seu voto, seu vizinho vai votar, e você vai suportar o cara. O que ratifica a afirmativa de que você tem o poder de mudar e melhorar o mundo.

Comece as mudanças no seu Município ou Estado. Faça as mudanças fazendo o melhor, no que você deve fazer. E com certeza, o melhor que você deve e pode fazer é escolher o melhor candidato para as eleições. Sei que vai ser uma tarefa árdua, mas possível quando sabemos melhorar. E comecemos sabendo que não vamos mudar nem melhorar de uma hora para outra; mas temos que começar a operação. Nada vai ser possível enquanto não nos educarmos para as mudanças. E tudo vai depender da nossa educação política. E o que sabemos dela? Nem mesmo a maioria dos políticos sabe o suficiente. E é por isso que devemos mudar o quadro.

O que você considera de bom no seu candidato? Muito cuidado com as promessas estapafúrdias, ou as falas sobre o que ele fez no seu mandato anterior. Lembre-se de que tudo que um político faz de bom no seu mandato é apenas parte do que ele deveria fazer. Logo, um dever cumprido não é mais do que a realização de uma obrigação. Se o candidato for novato na luta, cuidado com sua análise sobre ele. Analise suas qualidades, sua postura e, sobretudo, seu conhecimento de política. E não se engane porque a maioria dos que encaram as eleições está fitando a política apenas como um meio de enriquecimento.

Reflita sobre sua responsabilidade na escolha do candidato. E não caia na esparrela dos ignorantes que dizem que certo candidato rouba, mas faz. Faz o quê? Mas vamos mudar o rumo da prosa. Vamos ficar calmos e fazer o que devemos fazer. E o que devemos fazer é fazer o melhor para mudar o rumo da nossa história que está indo para o fundo do poço. E o mais importante é que nos valorizemos acreditando que só nós, eleitores, temos o poder de mudar isso. Porque somos nós que fazemos as mudanças e não os políticos. Eles apenas fazem o que queremos que eles façam. Desde que, claro, saibamos o que realmente queremos. Pense nisso.

*Articulista [email protected] 99121-1460